Episódio 100: O oscilógrafo ótico

Como se comporta um coração? No início do século XX a medicina já tinha respostas a esta questão muito para além da poesia, mas essas respostas ainda tinham dificuldade em expressar-se visualmente. A possibilidade de registo dos movimentos do coração a duas dimensões numa folha começava a florescer: surgiam os primeiros eletrocardiógrafos. A inspiração para o aperfeiçoamento dessa aplicação foi recolhida na tecnologia desenvolvida na área da telegrafia e da eletrotecnia, mais precisamente num aparelho chamado oscilógrafo.

Nas palavras de Carlos Ferreira Fernandes, diretor executivo do Museu Faraday e antigo professor do Instituto Superior Técnico, trata-se de “um aparelho que permite realizar a observação de sinais rápidos síncronos com a rede elétrica”. Os primeiros aparelhos foram desenvolvidos para a área da medicina – “a base está e quase se poderia dizer que (hoje) as coisas se mantêm da mesma forma” -, tendo conhecido depois grandes avanços na área da telegrafia. Um testemunho deles encontra-se atualmente no Museu Faraday, no campus Alameda do Instituto Superior Técnico: um oscilógrafo com três fechos óticos, datado de 1925 e fabricado pela Siemens.

O oscilógrafo ótico do Técnico “foi utilizado nas aulas até ao fim dos anos 60, pelo professor Carlos Ferrer Moncada muito conhecido aqui no Técnico. Acabámos por recuperá-lo aqui para o Museu”, descreve Albano Inácio dos Santos, também formado em Engenharia Eletrotécnica no Técnico e colaborador do Museu Faraday.

Este objeto, “visualmente muito apelativo”, é incapaz de disfarçar a sua antiguidade enquanto mostra aos visitantes do Museu “o que está a acontecer ali e como surge a imagem”. E é mais ou menos assim, segundo Albano Inácio dos Santos: “A origem começa numa fonte de luz, portanto uma lâmpada elétrica que produz uma fonte de luz, passa por um orifício ou uma lente e transforma-se num feixe fino de luz. Esse feixe vai dirigido a um espelho móvel que é nada mais nada menos do que um galvanómetro, que se move e reflete a imagem para um espelho que está a rodar. O Galvanómetro faz as rotações verticais e o espelho ao rodar produz uma continuidade da imagem num espaço horizontal. Podemos assim ver o sinal a duas dimensões de uma grandeza elétrica que passou pelo objeto”.

Ao contrário dos modelos mais recentes (também há um no Faraday) em que o aparelho já está contido numa caixa, esta versão tem as suas peças todas visíveis, o que permite visualizar como é que as coisas realmente aconteciam e funcionavam. Talvez seja esse o segredo que torna o oscilógrafo ótico num dos aparelhos mais visitados do Museu Faraday, a par do telefone do século XIX (Ouvir Episódio 5).  

A longa jornada de um objeto que começou por estar ligado, há mais de um século, a uma área como medicina poderá seguir novos caminhos de utilidade. “Neste momento está a ser utilizado no Museu Faraday com uma aplicação que permite aos alunos de Eletrotecnia perceber funções básicas da Eletrotecnia usando um dispositivo básico das células solares e que abre um domínio do aproveitamento da energia solar”, aponta Carlos Ferreira Fernandes. “Isto é um poço sem fundo. Eu duvido que as pessoas curiosas que começaram a trabalhar nestes alguma vez tivessem a perceção da importância do filão que aqui estava e que não para de nos surpreender”.

 

Categorias