Episódio 105: A consola de teleoperação espacial

Parece uma imagem do futuro: Um robot em Marte e um ser humano na Terra a receber todas as suas sensações. Com a mão esquerda sente a orientação em que o robot está e, com a mão direita, sente se o robot está, ou não, a perder tração. No presente, este é já um objetivo real da consola de teleoperação espacial construída por investigadores do Instituto Superior Técnico e do Instituto de Sistemas e Robótica de Lisboa (ISR-Lisboa). “Por exemplo, se o robot estiver a perder tração de deslizamento, sente-se na mão direita, com a luva, uma sensação de alguém estar a tocar-nos com a mão na pele, a deslizar um dedo pela pele. Se o robot estiver preso, sentimos um pulsar na mão a dizer-nos que o robot está preso e que por isso é que não está a andar”, exemplifica Rodrigo Ventura, professor auxiliar no Técnico e investigador no ISR-Lisboa.
A consola foi desenvolvida para ser usada numa missão analógica a Marte, que decorreu em Israel, em 2021. A sua particularidade: tem dispositivos táteis que permitem melhorar a noção que um operador tem quando está a reparar um robot à distância. “A mala foi construída para poder ser um dispositivo que contém tudo o que é necessário para teleoperar um robot, poder observar a imagem da câmara do robot e poder “sentir” aquilo que é a operação do robot, aquilo que, no fundo, ele está a “sentir” conforme se locomove no seu cenário”, aprofunda Rodrigo Ventura. A esse processo chama-se “mapeamento de um-para-um”: em vez de estarmos a tentar simular o que está a acontecer fisicamente com aquele robot, estamos a transmitir para uma pessoa exatamente o que está a acontecer com ele. Para além da informação visual, este objeto “faz apelo a outros sentidos”. A ideia surgiu para dar resposta ao excesso de informação visual que, mesmo em operadores experientes, tem causado algum sobrecarregamento cognitivo no processo de tomada de decisões em tempo real. “Já há alguns anos que temos vindo a estudar formas de tirar essa informação desse canal visual para usar outros sensores, como os tácteis”, explica.

Esta consola de teleoperação espacial é uma espécie de mala, um pouco maior que as convencionais malas de viagem, pesa cerca de 12 kg, com um portátil e um conjunto de dispositivos no seu interior. Como foi desenhada para missões analógicas a Marte em que os investigadores e criadores não estão presentes, é preparada de modo a que um astronauta análogo, possa montar a mala e colocá-la pronta a utilizar. “Há um conjunto de instruções que o operador tem de percorrer para montar a mala. Os fios têm de ser retirados e montados na borda da mala. Existe uma luva que o operador também tem de usar, existe um joystick que tem de ser tirado da mala e montado e, portanto, é um produto pronto a usar”, explica.
Entre os resultados já alcançados com este projeto, destaca-se um mais surpreendente para os investigadores envolvidos: “o dispositivo de altitude não só nos dá uma boa noção da orientação do veículo ou robot mas também uma perceção muito fidedigna do tipo de terreno ou do tipo de perturbações sobre as quais o robot ou veículo está a andar. Isto permite ter uma noção sobre se, por exemplo, podemos acelerar o robot até ao máximo porque temos noção de que o piso nos permite isso, que nos dá essa tração, ou se, por ser gravilha, ao acelerarmos estaremos a derrapar”, exemplifica.

Integrado no projeto europeu MEROP (More Effective Remote Operation of Planetary ground robots using multimodal interfaces), e com génese em projetos de robots de busca e salvamento (ouvir Episódio 45 – Raposa, busca e salvamento), a estrutura que surgiu em 2019, a partir de uma iniciativa da Agência Espacial Portuguesa e do ‘AMADEE’, organizado pela Austrian Space Forum, integrou a missão ‘AMADEE 20’, realizada no final de 2021. Para 2024 está já agenda a próxima missão do projeto. Enquanto se investiga e se espera, esta “mala” continua a gerar a despertar o interesse de quem visita o ISR-Lisboa, como aconteceu com o astronauta americano, Danny Olivas. Jéssica Corujeira, estudante do doutoramento do Técnico e investigadora do ISR-Lisboa, conduziu o encontro que resume assim: “É quase como estar com uma estrela. Para mim foi espetacular poder mostrar o nosso trabalho e ter o feedback do astronauta. Ficou maravilhado. Achou interessante termos pensado nessas formas de desenvolvimento e usado dispositivos hápticos para dar feedback que de outra forma seria dado visualmente, e que poderia não ser a melhor forma de perceber-se o que está a acontecer com o robot que não está em linha de vista”.

Categorias