Episódio 52 – Space CoBot

Num futuro próximo, numa estação espacial (mais ou menos) não muito distante, uma espécie de drone com seis hélices e muitos sensores está preparado para voar em qualquer direção e com qualquer atitude. Colabora com os humanos, se estiverem presentes, ou com os outros robots que ocupam o mesmo espaço. Esta podia ser a descrição de um conto de ficção científica escrito nos anos 90, mas trata-se na verdade de um projeto do Técnico, nascido em 2015, que tem aberto linhas de investigação na área dos robots colaborativos e da inteligência artificial.
O Space Cobot ainda não foi ao Espaço, apesar do nome, mas tem sido testado em ambientes de laboratório que simulam a ausência de gravidade. Foi projetado para ajudar no processo de transporte de cargas numa Estação Espacial. “A ideia nasceu com a colaboração que fizemos já aqui no Instituto de Sistemas e Robótica (ISR | Lisboa) na construção de robots que colaboravam com outras pessoas (ouvir o episódio 41 – Os Robots futebolistas e o episódio 45 – Raposa, busca e salvamento) . Estendemos a ideia ao domínio da estação espacial”, explica Rodrigo Ventura, professor no Departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores do Técnico e investigador no ISR | Lisboa. Foi desenhado não tanto para transportar carga mas para colaborar nesse processo. “O nosso foco está na autonomia, no controlo, nas decisões, na inteligência artificial, não ao nível da hélice”, explica.

Nasceu a partir de uma “chamada” da Estação Espacial Europeia (ESA), que desafiava equipas universitárias a construírem projetos para serem testados a bordo de um Airbus a300, que consegue atingir até 20 segundos de gravidade zero. Rodrigo Ventura, que trabalhava na área de busca e salvamento mas ainda não na área do Espaço, recebeu o email e na sala ao lado estava Pedro Roque, antigo aluno do Técnico e antigo bolseiro no ISR | Lisboa. E assim começava a nascer a ideia, em 2015, para o robot, que veio a ser desenhado com a ajuda da equipa do FST (Fórmula Student – ouvir o Episódio 7). Ao mesmo tempo apareciam as primeiras linhas do primeiro artigo científico do projeto, apresentado em 2016, na Coreia do Sul, na maior conferência da área da robótica, a IROS (International Conference on Intelligent Robots and Systems). Desse contacto com a comunidade científica surgiram várias parcerias científicas.
Para descrever este novo robot colaborativo, com cerca de 50 cm de diâmetro e 40 cm de altura, recorremos às palavras de Pedro Roque: “Imagine um drone, mas com 6 hélices, em vez que apontarem na vertical, são anguladas, porque temos que compensar a gravidade. É constituído por um cilindro no centro e depois as hélices estão enquadradas num cilindro mais achatado (mais pequeno e mais largo) que protege cada hélice individualmente”.

“Foi um dispositivo que abriu uma linha de investigação nova no Técnico / ISR | Lisboa e que abriu imensas possibilidades”, aponta Rodrigo Ventura. O Space Cobot abriu caminhos de investigação, por exemplo, para visitas e colaborações com a NASA, para participar em missões analógicas a Marte, para ganhar conhecimento para fazer um outro robot para impressão 3d, e à investigação com rovers (veículos de exploração espacial) com teleoperação.
E já inscreveu também o nome no futuro do ensino no Técnico, estando associado às várias teses de Mestrado na área da robótica. Deu ainda origem a uma cadeira em Ciências e Tecnologias do Espaço para os alunos do Técnico. E toda a atividade científica que gerou e a comunidade que envolveu muito contribuíram para que o Técnico viesse a ser escolhido pela Agência Espacial Europeia como entidade portuguesa que vai acolher o Space Studies Program da International Space University, um programa de topo a nível mundial na área do espaço para alunos graduados e profissionais [a realizar-se de 27 de junho a 26 de agosto de 20223, em Oeiras].
O Space Cobot não chegou a ser selecionado para ser testado na gravidade zero do projeto do Airbus da ESA, por questões administrativas, mas a esperança de ir para o Espaço continua intacta para Rodrigo Ventura. “O desenvolvimento de algo que vá para o espaço é um processo longo. Enquanto isso não acontece…”.


Histórias Extra:

Como se testa gravidade zero sem gravidade zero?
«Aprendemos com a NASA. A existência de um set up laboratorial que consiste numa mesa plana de pedra polida, sobre a qual flutuam almofadas de ar onde é injetado ar comprimido, neste caso CO2. não há qualquer contacto físico entre uma plataforma e essa mesa. Colocamos o robot lá em cima e só nos fica a faltar a direção vertical, porque aí não podemos fazer nada. Mas no plano horizontal conseguimos que ele se mova. É usado na NASA e também no MIT. E replicámos cá no laboratório do Técnico, no campus TagusPark, em Oeiras.»
(Rodrigo Ventura)

Das dificuldades de colaboração entre robots e humanos aos desafios de um robot no Espaço
«Colaborar com humanos é mais complicado, é muito mais desafiante saber o que é que o humano vai fazer. O que é que o robot deve fazer para ajudar o humano numa determinada tarefa? Isso por si só é um problema. O projeto Space Cobot aborda o aspecto da sua construção física – como se move, como é autónomo -, até aos aspetos mais gerais de como é que podemos ter um robot que colabore e que ajude proactivamente um humano. Para além disso, na Estação Espacial há um requisito muito grande a nível de ruído. Os astronautas estão sujeitos já a tanto ruído que têm muito pouca tolerância que sejam introduzidos novos objetos que produzam ruído.
O transporte de carga adereça um desafio muito concreto. Por exemplo, a Estação Espacial Gateway, na Lua, vai ter meses e meses sem astronautas lá dentro. E vai ser necessário fazer chegar lá naves com carga e descarregar de forma totalmente autónoma com robots. O Space Cobot também se integra na procura de soluções para conseguir este transporte de carga sem astronautas.
Toda a comunidade de robótica e inteligência artificial ambiciona robots cada vez mais autónomos, o que também se aplica à área do Espaço, que tem a particularidade de ser extremamente difícil garantir o transporte de humanos lá para cima. A sua manutenção, a segurança, a radiação são alguns dos maiores problemas. É um ambiente hostil em que a utilização dos robots é particularmente interessante e útil.
Para além disso, cada vez mais se assiste à entrada da indústria no Espaço. Prevê-se que haja muito mais estações espaciais, “fábricas” em órbita. Por isso é preciso robots, porque os custos de ter astronautas a fazer a manutenção das fábricas são altíssimos.»
(Rodrigo Ventura)

 

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