Episódio 37 – Os Modelos de Minas de Freiberg

Em plenos anos 80, os corredores do edifício de Minas, no campus da Alameda do Técnico, estavam preenchidos com dezenas de volumosos modelos de Minas. “Passava sempre pelos modelos para entrar nos gabinetes ou para ir para as aulas”, recorda Matilde Costa e Silva, docente na área de georrecursos do Departamento de Engenharia Civil, Arquitetura e Georrecursos. “Todas as pessoas da minha geração recordam de certeza aqueles modelos”, em particular os cuidados que o professor Fernando de Mello Mendes tinha quando alunos e professores passavam para as aulas. “Zangava-se quando alguém punha os livros em cima de algum modelo, como eram materiais muito frágeis…”.
A história destes mais de 50 modelos, começa em Freiberg (Alemanha), ainda no século XIX, e cruza-se com o Técnico pela mão de Alfredo Bensaude, primeiro diretor da Escola. Primeiro no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa, e posteriormente no campus da Alameda, onde permaneceram muitas décadas até seguirem para o Centro Ciência Viva do Lousal, onde estão agora expostos. Todos com exceção de um, que se encontra nos Museus de Geociências do Técnico.

Estes Modelos de Minas de Freiberg são réplicas de minas reais e do equipamento utilizado nessas minas, sobretudo as subterrâneas. Representam o processo de extração de uma mina e replicam o conjunto de uma estrutura constituída por várias galerias e pelo poço de acesso. Estes modelos antigos são constituídos por peças amovíveis, o que possibilitava uma visualização a três dimensões, um potencial pedagógico fundamental para grande parte do século XX. “O meu orientador, Fernando de Mello Mendes (que foi o grande zelador destes modelos, sem ele estes modelos não tinha chegado até hoje), contava com alguma graça que nos anos de estudante dele, que seriam os anos 40, os livros de consulta bibliográfica não abundavam e portanto para os alunos era extremamente importante, eram muito didáticos com estas peças amovíveis, perceber quais eram os componentes fixos e os componentes móveis. A alternativa era visitar uma mina para perceber”, conta Matilde Costa e Silva.

Depois de décadas no Técnico e muitas mudanças e restauros, os Modelos de Minas viajaram 140 quilómetros até ao Centro Ciência Viva do Lousal “Mina de Ciência”, no Alentejo, num complexo mineiro verdadeiro, que esteve ativo entre 1900 e 1988. Converteu-se em “Museu” em 2001 e apresenta no seu espólio instrumentos de produção de ar comprimido, fundamental para a operação mineira; equipamentos de produção de energia elétrica, grupos de combustão interna e, claro, as maquetes de modelos de minas do Instituto Superior Técnico. As maquetes estão espalhadas em sete áreas diferentes da indústria mineira, dedicados à parte subterrânea, ao transporte, às questões do ar, da água, de lavagem e tratamentos minérios e, por último, do fogo.
“Esta parceria permite a conservação dos objetos e por outro lado a exibição dos mesmos, perpetuando a sua função na capacidade de educar, de formar, agora num contexto informal e como conhecimento histórico e não projetado para o futuro”, aponta Álvaro Pinto, Diretor Executivo do Centro Ciência Viva do Lousal (CCVL) e professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa). “A alternativa de não os expor seria a sua morte e não queríamos que objetos como estes desaparecessem. Estamos a perpetuar a sua vida”, complementa. “Uma vez aqui instalados, têm essa enorme mais valia de estarem acessíveis, visíveis e acima de tudo revelarem a evolução que a história faz para termos o que temos nos dias de hoje. Estes modelos permitem uma leitura museológica a vários níveis: para muitas crianças equivalem a brinquedos fascinantes e à medida que os níveis etários aumentam vão tendo leituras cada vez mais técnicas”, complementa Jorge Relvas, Presidente do CCVL e também docente em Ciências ULisboa.
Matilde Costa e Silva gosta do espaço que os modelos ocupam no Museu: “Têm um espaço digno para estar, aqui não teriam essa visibilidade. O que não quer dizer que se o Técnico vier a fazer um museu grande de várias áreas, eu preferia que estivessem aqui”. Uma expressão da saudade que encontra equivalência no pensamento de Jorge Fernandes, funcionário do Técnico, que foi contratado no final dos anos 80 com o objetivo de restaurar os modelos: “Eu vim para cuidar deles, estavam todos partidos. Aquilo não era meu mas era como se fosse meu. Ainda não tive a oportunidade de os ir visitar [ao Lousal]. Um dia destes sou capaz de passar lá, quando tiver um trabalho para aqueles lados”.

O futuro dos modelos e a reabilitação do Museu Mineiro do Lousal
«Projeto AMPERE (Arqueologia Mineira e Património Elétrico como Recurso Educativo) que pretende reabilitar o museu mineiro do Lousal. O Museu abriu em 2001 e está a necessitar de ser revisto. Vamos usar tecnologia precisamente para dar um maior destaque a estas peças. No que respeita às maquetes do Técnico, o objetivo será diminuir a sua área expositiva mas, no entanto, investir em alguns objetos de destaque, melhorando o discurso expositivo destes objetos de destaque, reabilitando alguns destes objetos e dando o destaque que cada um deles merece neste Museu. O Museu vai fechar nos próximos meses e em 2024 devemos voltar a abrir. Em 2024 verá um Museu completamente modernizado. Os Modelos do Técnico estarão na nave central do Museu do Lousal, parte dela continuará a ser dedicada a esta exposição de modelos de minas. A ideia será selecionar alguns objetos de destaque também para lhes dar mais espaço, para que as pessoas explorem o detalhe. Deixando sempre uma abertura para que façamos renovações porque temos cerca de 50 modelos. Há a possibilidade de expor parte destes modelos e depois temporariamente fazer alterações aos que estão expostos, e ir disponibilizando os diferentes modelos ao longo do tempo».
João Costa, gestor de projetos do Centro Ciência Viva do Lousal

 

  • Agradecimentos:
    Álvaro Pinto
    Matilde Costa e Silva
    João Costa
    Jorge Fernandes
    Jorge Relvas
    Centro Ciência Viva do Lousal

    Departamento de Engenharia Civil, Arquitetura e Georrecursos
    Museus de Geociências do Técnico

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