Episódio 65 – O autómato de subestações

A informatização da rede elétrica nacional e o seu funcionamento em rede é hoje uma realidade consolidada. Mas nos inícios dos anos 80 era apenas uma ideia projetada num aglomerado de circuitos e centenas de cabos que constituem o autómato de subestações, o equipamento com forma de armário que viria ajudar a revolucionar a rede elétrica nacional e se tornaria um símbolo do contributo do Técnico para esse processo. Hoje pode ser visto no Pavilhão de Eletricidade, no edifício da Torre Norte do campus Alameda do Instituto Superior Técnico, em Lisboa, no Laboratório de Alta Tensão Professor Domingos Moura, onde foi também concebido. José Luís Pinto de Sá, professor aposentado do Técnico (“trabalhei a maior parte destes anos neste laboratório, como área de investigação e depois como área de ensino”), foi um dos responsáveis pela sua implementação, que começou em 1987 e durou até inícios dos anos 2000. “A capacidade de ligar as redes entre si e criar uma grande rede só é possível com sistemas informáticos poderosos. E qual é o interesse de ter uma rede dessas? Permite, por exemplo, importar energia de forma segura, porque as redes estão interligadas”, explica.

Nos inícios dos anos 80, a EDP “não tinha informáticos, o sistema não estava informatizado, tinha adquirido uma dimensão difícil de controlar, nem tinha uma coisa que veio a ter dez anos depois: um sistema com um computador central, com ramificações por telecomunicações às subestações todas onde se recolhe informação, o que por sua vez permite controlá-las”. É o chamado “sistema de despacho” (hoje garantido pela REN) que permite distribuir os fluxos de potência de energia da melhor forma entre as várias redes, assim como solicitar às várias centrais elétricas disponíveis a sua produção de forma a cobrir o consumo da forma mais rentável. O passo intermédio passou pelo autómato de subestações e Portugal foi um dos países pioneiros, a par da França, a “instalar nas subestações um nível intermédio de inteligência”. “Não havia um computador central, mas passou a haver já computadores centrais/locais nas subestações”, descreve Pinto de Sá.
Foi essa necessidade – automatizar as reações locais, melhorar a qualidade de serviço – que esteve na origem do projeto de colaboração entre o Técnico e a EDP, que apanhou Pinto de Sá como assistente estagiário, em 1980, orientado por José Pedro Sucena Paiva. “Foram-me apontados os microprocessadores que eram na altura a grande novidade tecnológica que estava a aparecer na área de energia”, recorda. “Eu não sabia nada de microprocessadores. Era um desafio interessante e fui aprender”, complementa. O projeto era também uma resposta ao desafio emergente de dar um novo cunho à área de energia e de orientá-la para a investigação, que coincidiu com a chegada de professores do estrangeiro. “Corresponde a uma época revolucionária. Nas Faculdades de engenharia acreditou-se que o país ia finalmente fazer a sua revolução de desenvolvimento e que as universidades iam ter um papel importante no desenvolvimento tecnológico da nossa indústria. Passando a fazer investigação cá em vez de ir fazer ao estrangeiro. Ou em vez de fazer apenas engenharia corriqueira que era o que os professores das universidades faziam antes”, descreve.
O projeto do autómato de subestações foi um dos grandes exemplos de interação entre academia e o tecido industrial, indo muito além dos trabalhos apenas teóricos e académicos. “A cultura de servir o país motivou e entusiasmou muito os jovens. Foi um movimento cultural”.

 

História Extra
Descrição detalhada do autómato de subestações do Técnico
«Aqui neste espaço não é objeto mais visível, com luzes e com uma frontaria visível: é o simulador de subestações, um simulador discreto, que simula os acontecimentos binários que acontecem numa subestação e que são observados por aquilo que é a peça fundamental que é o autómato. Está aqui numa caixa, num armário. Nesse tempo (inícios dos anos 80) ocupava este espaço, era um conceito que havia de autómatos, com uma carta principal de processamento, um microprocessador, de 16bits…
Para compreender a importância histórica do equipamento há que notar que coincide quase com o aparecimento dos microprocessadores, que surgem em meados dos anos 70. Os primeiro microprocessadores de 16bits já são suficientemente poderosos e foi um dos conceitos que presidiu a este projeto, que foi concentrar tudo num microprocessador mais poderoso e complicar as coisas no software e no hardware.
Esse processador está ligado aquele simulador, por centenas de cabos… o que ocupa mais volume são os cabos todos.
Estão ligados por trás ao processador, e estão ligadas pela frente por cabos que depois vão ligar a réguas de terminais, que é um tipo de coisas que existe nas subestações reais. Das réguas de terminais de cada um destes fios sai um contacto que ia por uns cabos que estavam entrançados para um simulador.
Isto permitia que se simulasse acontecimentos. O simulador tem uma série de botões na parte da frente onde eu posso simular curto-circuitos, manobras na subestação, manobras comandas manualmente ou por alguns equipamentos que não faziam parte do autómato, equipamentos também de controlo que tradicionalmente eram eletromecânicos e que continuavam a ser quando se fez este projeto do autómato e funcionavam como fornecedores de dados, de informação binária para o autómato que, no fundo era um computador que controlava tudo, observava tudo o que acontecia, datava os acontecimentos com uma resolução de centésimo de segundo, fazia também observações de medida e fazia um processamento elementar das formas de onda, portanto produzia medidas digitalizadas e depois executava comandos sobre o simulador, testando o software que visava controlar as subestações.»
José Luís Pinto de Sá

 

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