Episódio 8: O Barómetro de Torricelli

Sabe-se que terá sido construído no século XVIII, segundo a técnica de Torricelli, que hoje está no Técnico e pouco mais. É um barómetro com cerca de 250 anos que resistiu a revoluções, guerras, à degradação natural do tempo e se mantém, hoje, quase milagrosamente intacto. Foi resgatado de um monte de instrumentos antigos prontos a ir para o lixo, no Técnico, há alguns anos por Rui Dilão, professor de Física Matemática e Sistemas Dinâmicos no Técnico, e continua a medir a pressão com eficácia. “Foi um dia incrível quando começamos a ver que estava a funcionar. Analisámos com detalhe. Dizia no topo “Segundo Torricelli” e ficámos… é um milagre! Bastava ele ter estado deitado no chão, ou inclinado, para estar inoperacional, porque o mercúrio fugia”.

Como assim o mercúrio? A resposta está na descrição do instrumento: Um objeto de madeira com 1,20 metros de altura, que suporta um tubo cheio de mercúrio, com uma ponta fechada e outra aberta. O tubo está mergulhado numa trina de mercúrio. “O que vai acontecer é que o mercúrio que está no interior do tubo sobe ou desce conforme equilibra a pressão que se exerce sobre a superfície do mercúrio que está livre. Essa pressão é compensada pela pressão do ar”. É assim, de acordo com a invenção de Evangelista Torricelli (1608-1647), que usamos o barómetro para medir a pressão atmosférica. “Só com as medições do barómetro conseguimos prever se vai chover, se vão haver nuvens, se vai estar bom tempo. A maior parte das previsões atmosféricas podem ser feitas com um barómetro”, explica Rui Dilão. Por ser aberto em cima, o barómetro tem que estar sempre na posição vertical, de modo a que o mercúrio não se derrame. “O mercúrio não evapora, praticamente. O mesmo mercúrio está ali desde o século XVIII. Este objeto chegou a Portugal um bocadinho antes da Revolução Francesa provavelmente, chegou cá impecável e nunca teve uma fuga. É um milagre ter um objeto destes neste estado de conservação”, acrescenta. Para além disso, o tubo suporta também uma camada de ar – “provavelmente tem restos do ar que se respirava no século XVIII”.

“Vivemos submersos num oceano de ar”. A frase de Torricelli, dita de cor por Rui Dilão, sintetiza o pensamento daquele que foi um dos grandes físicos europeus e que se tornou célebre pela invenção do barómetro. O instrumento com método de mercúrio apenas chegou depois de uma primeira tentativa um pouco mais aparatosa: “Era um barómetro de água, com 10 metros de altura – tinha que subir ao telhado da casa para ver a altura da água. Por ter um tubo com água ao lado de sua casa, foi imediatamente acusado de heresia. Talvez para fugir a isso, reduziu de 10 metros para 1 metro e passou a ter um barómetro dentro de casa”, conta Rui Dilão.
Torricelli foi também discípulo de Galileu Galilei, em particular nos três meses que este viveu após ter saído da prisão da Inquisição. “Quando [Galileu] saiu da prisão estava cego e não conseguia fazer experiências, nem escrever. Um jovem chamado Torricelli foi o seu secretário, técnico de laboratório e vivia em sua casa. Depois da sua morte, continuou a trabalhar, começou a produzir lentes, começou a trabalhar sobre a ciclóide, uma das coisas que o Galileu fez no fim de vida e foi muito importante para o desenvolvimento do relógio. É o que sabemos do Torricelli, além do barómetro. Na altura nem se sabia muito bem o que era a pressão, cuja ideia só aparece muitos anos mais tarde”, explica Rui Dilão.
E quanto ao futuro do barómetro do Técnico “segundo Torricelli”? “Está em pé há 250 anos, pelo menos, o que é uma coisa incrível. E eu mantenho-o em pé, aparafusado à parede [do seu Gabinete, no Pavilhão de Física], para estar seguro. Tenho medo que alguém lhe dê um encontrão”, brinca. “Irá sair para um sítio que tenha as condições apropriadas, um Museu do Técnico ou de Ciência e Tecnologia, por exemplo”.

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