Episódio 98: O permutador de calor

No átrio principal da Torre Sul, campus Alameda, faz-se notar um imponente instrumento científico cilíndrico, com cerca de duas toneladas de peso e com dois metros e meio por um metro de diâmetro. Trata-se de um permutador de calor ou, mais concretamente, de metade desse objeto, que foi cortado ao meio e está exposto com partes abertas para assim dar acesso visual aos seus pormenores técnicos.
“É um cilindro, com tubinhos lá dentro”, simplifica Sebastião Alves, professor associado de Engenharia Química no Instituto Superior Técnico. Mas também avança com uma descrição mais completa: “É um feixe de tubos. E os tubos estão num invólucro que é um cilindro grande – a caixa. E entre a caixa e os tubos passa o fluido (que pode ser um gás, pode ser vapor, pode ser um líquido quente ou frio). Serve para aquecer o fluido que está a passar dentro dos tubos. É isto o permutador de calor”. Esta peça de enormes dimensões, com uma cabeça flutuante e 224 tubos, está no Técnico com objetivos “pura e simplesmente pedagógicos”. Todos os anos, mais de uma centena de estudantes de Engenharia Química da Escola analisam atentamente os pormenores do permutador de calor.

É que, apesar de as suas primeiras versões terem sido desenhadas há cerca de um século, ainda se trata de um equipamento com forte presença em indústrias químicas, como refinarias, por exemplo. E como funcionam? Damos como exemplo a produção de um corante, a anilina. “Vamos usar benzeno para fazer uma reação com ácido nítrico. Vamos precisar de ter dois tanques para armazenar os reagentes e vamos bombeá-los para uma coisa chamada reator, que é onde se faz a reação e depois da primeira reação ainda vai ter uma segunda e temos de separar os produtos, um dos quais será a anilina. E para isso há muitas peças de equipamento possíveis. Às vezes usam-se colunas de destilação, que podem ter 40 metros de altura e até luzinhas para os aviões, dez metros de diâmetro, etc. E depois acaba nos tanques dos produtos”, detalha Sebastião Alves. Neste processo, o reator pode estar a uma alta temperatura e pode ser necessário aquecer ou arrefecer as correntes de líquido ou de gases (reagentes). É aí que entra o permutador de calor.

A metade deste permutador do Técnico também conheceu muitas variações de temperatura na história que o trouxe até à Torre Sul. Começa em Inglaterra, na Universidade de Bradford, já no início deste século. A peça estava exibida à entrada do Departamento de Engenharia Química dessa universidade até uma decisão política local decidir fechar o mesmo Departamento. Entra na história Jorge de Carvalho, professor aposentado do Técnico que havia feito o seu doutoramento nessa mesma Universidade. “Ele foi a um congresso onde encontrou o seu antigo orientador e presidente desse Departamento muito chateado porque o estavam a fechar”, conta Sebastião Alves. Depois de um inquérito feito nas Universidades inglesas a perguntar quem queria os equipamentos de Bradford, apenas houve uma manifestação de interesse: A Universidade de Leeds. “Leeds e Bradford são duas cidades próximas e são rivais e os Departamentos também são rivais. Eles não queriam dar o permutador a Leeds e perguntaram ao Jorge Carvalho [que já tinha mostrado interesse nas colunas de extração de líquido] se ele o queria por uma libra”, recorda. O antigo professor do Técnico avançou para a missão de resgate desta peça pedagógica, mas o barato nem sempre é como que parece: “Ele diz que desembolsou cerca de 600 contos, na altura, hoje seriam 15.000 a 20.000 euros do bolso dele, para ir lá buscar esta metade do permutador”.

Categorias