Episódio 93: As zincogravuras

É o Técnico que nunca chegou a acontecer. Mas ficou registado num conjunto de gravuras plasmadas em zinco, que testemunham os detalhes do projeto de edifício desenhado, no início do século XX, pelo Arquiteto Miguel Ventura Terra (1866-1919). A publicação, em 1916, de oito gravuras foi a expressão do primeiro projeto criado a partir do desafio lançado por Alfredo Bensaúde, o primeiro diretor do Técnico: criar um novo espaço para a Escola que valorizasse o ensino e a prática da engenharia. “Era um projeto muito importante que afirmava esse lado progressista da sociedade portuguesa”, explica Ana Tostões, professora no Departamento de Engenharia Civil e Arquitetura do Técnico.

As zincogravuras do Técnico podem ser encontradas no Museu de Civil, no campus Alameda – “riquíssimo em termos de história da construção e da arquitetura de Portugal e da Europa”. Surgiram para ser usadas em tipografia, para impressão em periódicos, e hoje estão expostas em destaque num armário envidraçado do Museu. Cinco delas foram pensadas para formatos maiores (30 centímetros de altura por 80 de largura) e três peças para formatos mais pequenos (20 centímetros de altura por 30 de largura). “Representam os cortes transversais e os alçados transversais, no fundo é a largura do edifício e os maiores são o grande comprimento do edifício”, detalha Ana Tostões. O edifício foi projetado para ser construído num espaço próximo do edifício onde hoje funciona a Assembleia da República, em Lisboa. Quando a encomenda do projeto foi feita por Alfredo Bensaúde a Ventura Terra, a “educação era um dos grandes cavalos de batalhas dos republicanos”, argumenta Ana Isabel Ribeiro, historiadora e investigadora da Câmara Municipal de Lisboa. “E estamos a falar de dois protagonistas que não deixam margem para dúvidas [a esse nível]”, complementa.

O projeto estava bem encaminhado, incluindo a consumação de um pedido de empréstimo para a sua construção, mas acabou por nunca sair do papel (e das zincogravuras), por força de uma sequência de acontecimentos mal sucedidos: o terreno tinha alguns problemas, sobretudo um posto de desinfestação que se revelou impossível de desmantelar, o que gerou uma espera prolongada e reuniões para procura de outro terreno, culminando com a morte prematura aos 52 anos do autor do projeto, em 1919.
“Foi o único equipamento de Ensino Superior que ele acabou por projetar. Em Lisboa já tinha feito três importantes liceus, que revolucionaram o desenho desse tipo de edifícios [como o Liceu Camões e o Liceu Pedro Nunes], e também duas escolas primárias, até oferecendo os projetos, como no caso de Salvaterra de Magos na sequência de umas cheias”, descreve Ana Isabel Ribeiro.

No local onde podia ter nascido o Técnico, acabariam por surgir, já nos anos 40, os Jardins do Palácio de São Bento. Quanto ao Técnico, veria o seu edifício erguer-se na Alameda, construído entre 1928 e 1935, num projeto então desenhado pelo arquiteto Porfírio Pardal Monteiro (ouvir Episódio 19: A 1.ª Imagem do Técnico).

 

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